Por que Toronto?

“Moro no Rio de Janeiro. Hoje, ao sair de casa, vi vários helicópteros no céu. Mau sinal. Caminhei pela minha rua, desviando dos carros estacionados em cima da calçada, por vezes tendo que passar pelo asfalto. Levei 3 picadas de mosquito (preciso lembrar do maldito repelente) no caminho até o ponto da van fretada que pago pra ir até o trabalho com um pouco de dignidade. Cheguei atrasada, às 07:40. Meu marido não teve a mesma sorte. Ficou quase meia hora esperando a van (também fretada) conseguir desviar do imenso engarrafamento em Jacarepaguá para buscá-lo. Era uma operação da polícia na Cidade de Deus, uma favela horizontal do Rio, cujas ruas principais são passagem pra muitos motoristas corajosos que tentam desviar do caótico quarto pior trânsito do mundo. Todos os acessos foram fechados, deixando os motoristas sem caminho alternativo e Deus sabe que Jacarepaguá não comporta todo mundo que tem carro. Duas horas depois, meu marido chegou no trabalho. Um trajeto de 34 Km. Só mais um dia no Rio de Janeiro.”

Este pequeno trecho, que retrata o meu dia de hoje, esconde em pequenos dilemas cotidianos uma série de problemas crônicos, da minha cidade e do Brasil como um todo, nesta ordem: guerra urbana e absoluta falta de segurança, pessoas sem nenhuma educação ou respeito pelo próximo, descaso com a saúde pública e infraestrutura de saneamento básico deficiente, transporte público de péssima qualidade, impostos que não trazem qualquer retorno e nos obrigam a pagar por tudo duas vezes, trânsito infernal, crescimento desordenado e absolutamente nenhum planejamento urbano.

Isso é uma pequena porção do que são as nossas vidas e as de milhões de outros brasileiros, que têm que lidar com tanta adversidade, todos os dias, só pra chegar ao trabalho. Quanto talento será que já não foi desperdiçado, quantas ideias boas esquecidas nos arrastões em Linhas Vermelhas da vida brasileira? É claro que isso traz consequencias à saúde econômica de um país e, na minha humilde opinião, o atraso do nosso Brasil não vai mudar nunca.

São bons motivos pra querer sair daqui. Mas nada disso importa quando falamos em imigrar.

– Ué, como assim?

Pois é…. Você já parou pra pensar em que motivos te levam a querer morar em outro país? O processo de imigração é longo, caro e estressante, por isso uma das coisas mais importantes pra se ter em mente é não apenas o que vai te fazer ir, mas o que vai te fazer FICAR. É isso que interessa. Depois dos primeiros anos fora, toda essa loucura de nossas vidas brasileiras vai ficar pra trás e então, o que resta? Antes de dar esse gigantesco passo em sua jornada e abrir mão especialmente do convívio diário com quem você ama, descubra o que atrai você no novo país. A melhor forma de descobrir é indo até lá ver e por isso recomendo fortemente uma visita exploratória. É caro? É, mas pode te salvar de cometer um grande erro ou te dar ainda mais fôlego para ir atrás do seu objetivo.

O Canadá, país que escolhemos para nos mudar (e agora esperamos que ele também nos escolha, rs), é o total oposto de todas estas questões que hoje nos assombram. Porém, novos problemas virão e não podemos nunca perder isto de vista. O que me atrai lá não é a busca por uma solução mágica para todos os meus problemas. Após conhecer uma parte do Canadá, algumas cidades e províncias, meu coração bate mais forte mesmo é por Toronto. O que eu busco lá é viver na cidade onde eu encontrei algo que sempre desejei mas não imaginei que fosse possível: esta mistura perfeita de natureza e cidade grande, o conforto (e a agitação) de uma metrópole cosmopolita aliado à paz das imensas áreas verdes. E o Outono?! E os esquilos? E os museus, restaurantes e bares? Nossa, começo a escrever e o coração fica pequenininho de saudade…

Meu amor pela cidade vai além dos benefícios. E é isso que temos que buscar em qualquer relação de nossas vidas, mesmo que seja com a cidade em que vamos morar. Essa paixão que vai além do “o que eu vou ganhar com isso” nos motiva a superar obstáculos e vai nos motivar lá também, pois os primeiros anos serão os mais difíceis. Pra terminar o textão, vou compartilhar aqui minha lembrança do momento exato em que decidi que era em Toronto que queria passar o resto da minha vida.

Estávamos Rafa e eu caminhando pelo High Park num dia de semana à tarde, após o curso de inglês. Fazia um sol gostoso, e estávamos explorando novas áreas do parque. Paramos pra observar um grupo de patos (amo patos! =D) e encontramos um casal de velhinhos que os observavam também. A senhora resolveu puxar assunto comigo: “Não é incrível viver aqui? A cada dia, uma nova aventura!”. Eu concordei, rimos e seguimos nosso caminho. Olhei pra alegria e jovialidade daquele casal e, de repente, vi a esperança se sobrepôr a um dos meus maiores medos na vida: o de envelhecer. Percebi que a vida não precisa ser tão complicada no cotidiano, que as pequenas coisas foram feitas para serem assim, pequenas. Que quanto menos nos preocupamos com assaltos, pessoas mal educadas, locais pouco acessíveis, mais temos tempo de admirar a beleza da vida. Pode parecer banal, mas foi ali que a ficha caiu. Não era o mundo que estava errado, eu estava no lugar errado. As minhas prioridades não batiam com as prioridades do meu país, do meu povo. E foi aí que eu percebi que o meu medo de envelhecer era, na verdade, medo de envelhecer no Rio de Janeiro. E, no meu coração, tudo mudou.

Pra quem leu até aqui, obrigada pela perseverança. E espero ter posto uma pulga atrás da orelha de todos que pensam em imigrar. O que te motiva? O que te apaixona? Do que você tem medo?

Até a próxima! =)