Sobre estar indo embora…
Enquanto escrevo este post, escuto de longe os tiros de metralhadora da Cidade de Deus, favela horizontal do Rio de Janeiro, relativamente próxima aqui de casa. Hoje a Linha Amarela, importante via da cidade, foi fechada por conta de um intenso tiroteio entre a polícia e os traficantes, os motoristas saíram dos seus carros e deitaram no asfalto pra tentar se proteger. Um helicóptero da polícia foi derrubado mais cedo, há poucos quilômetros aqui de casa. Não pode ser normal viver nesse cenário de guerra. Essas situações me lembram, sempre que o coração aperta, por que estamos indo embora.
Nossos amigos que já foram pro Canadá têm nos relatado uma coisa curiosa: a tal da crise dos três meses. Segundo eles, depois de três meses muitas coisas já entraram na rotina, a novidade de viver num novo país se esvai, a saudade aperta e o imigrante recém chegado começa a se perguntar: “o que foi que vim fazer aqui?”. Pois bem, o que posso adiantar pra vocês é que ainda não sabemos se essa crise vai nos pegar lá, mas a saudade antecipada já nos pegou por aqui.
Interessante que estamos exatamente no terceiro mês desde que recebemos a notícia que mudaria nossas vidas. A princípio, a vida continuou igual, trabalho, casa, família, amigos… Mas a partir do momento que fomos começando a vender nossas coisas, encontrando com amigos e conhecidos naquele clima de eterna despedida e que o Natal se aproxima (faltam 36 dias) e com ele nosso vôo RJ x TO (estavam mais baratas as passagens no dia 25), a ficha foi começando a cair. Nossos amigos, nossa família, nossos empregos dos quais gostamos, nossos móveis que compramos com tanto carinho, vão ficar para trás. Grandes amigas minhas estão planejando casamento e até o primeiro baby e eu não tenho como saber se vamos conseguir vir ao Brasil para participar desses eventos.
A realidade já bate na porta e a realidade do imigrante é dura. Por outro lado, cada vez que conversamos com alguém ou até mesmo nos abrimos com nossos amigos e nossa família, eles sem nenhum egoísmo nos dizem que estamos fazendo a coisa certa e que eles, quem sabe um dia, se juntarão a nós. Em todo canto que passamos, temos notícias de duas, três pessoas que estão deixando o país e o futuro dos queridos que ficarão aqui muito me preocupa. As novas gerações, que estudaram e se espacializaram, muitas vezes com dinheiro público, estão saindo do Brasil. Os profissionais de ponta que hoje estão aqui, já fizeram carreira e têm estabilidade, em breve serão aposentados. Quem vai levar o país pra frente?
Enfim, apenas desabafos e pensamentos de uma candidata a canadense que, nesse momento, tem que decidir se dorme no próprio quarto (que tem janela pra rua) ou infla um colchão no segundo quarto (que dá pra dentro do condomínio) pra dormir mais tranquila. Deixo pra vocês um texto que escrevi em meu Facebook no dia que buscamos os passaportes, pra compartilhar com amigos e conhecidos nossa alegria e tentar fazer com que entendessem um pouquinho do que estávamos sentindo. Fez o maior sucesso. 🙂
” Lembro até hoje do dia em que atravessamos a fronteira do Canadá, depois de passar 10 dias nos EUA. Já morávamos em Toronto há dois meses, mas não eu fazia ideia do quanto aquela cidade havia mudado em mim. Não tinha noção do quanto eu me sentiria estranha fora dali. Mas o que mais me surpreendeu não foi a falta que o Canadá me fez nos EUA, mas a sensação que eu senti ao voltar: “gostosa como um abraço”, a paz de olhar aquela bandeira vermelha e branca e me sentir em casa. Estar de volta em terras canadenses me deu alívio tão grande que alguma coisa em mim saiu do lugar naquela hora, e nunca mais voltou.
Nós procuramos por essa sensação no Rio, ao voltar. Temos uma vida maravilhosa, graças a Deus, mas algo nos faltava. Uma parte do nosso coração ficou em Toronto. E agora, finalmente, podemos voltar pra buscá-la.
Ser imigrante não é fácil.
Ser imigrante não é chique.
Ser imigrante é sentir saudade.
Ser imigrante é recomeçar a vida quase do zero.
Ser imigrante é falar outra língua (ou outras) o dia todo.
Ser imigrante é deixar sua zona de conforto.
Ser imigrante é escolher um novo país pra chamar de seu e torcer para que ele também escolha você.
Ser imigrante é tentar não enlouquecer no processo.Mas, hoje, o Canadá também nos escolheu. Hoje, podemos descansar um pouco o coração do sufoco e das angústias da espera e simplesmente sorrir. Hoje podemos, aliviados, saber que vamos voltar pro nosso antigo novo lar, que o coração escolheu. Sabemos que uma parte (enorme) do nosso coração vai ficar aqui, que viveremos o resto de nossas vidas divididos pela saudade de quem amamos. Sabemos também que estar divididos já era uma condição desde que pisamos em Toronto pela primeira vez e que isso não mudaria nunca. O preço da imigração já estava cobrado. Agora, vamos atrás da recompensa. E queremos, sim, todos os que amamos e que nos amam cada dia mais perto de nós, seja por Skype, whats app, telefone ou ocupando a cama do quarto ao lado ou o sofá da sala, bem pertinho de nós (e isso é o que mais queremos!).
Exatos dois anos se passaram desde que chegamos no Canadá até o dia em que fui entregar nossos passaportes no Centro de Vistos para que fosse emitido o visto de imigração. Exatamente um ano se passou desde que começamos o processo. A maior parte das angústias, do choro, da ansiedade e também das alegrias, das novas amizades e experiências, ficou só entre nós. Porque tem coisas que só a gente entende mesmo e não vamos ficar amolando ninguém com isso.
Ser imigrante é uma luta silenciosa.
Mas é também uma aventura incrível.
Que venha 2017!
Partiu Canadá!”
Nossa, a Guerra Civil que vivemos constantemente é uma coisa totalmente angustiante. Eu e meu marido falamos isso o tempo inteiro, o que nos faz querer ir embora é o “viver com medo”. Medo de ser assaltada, medo de sofrer um sequestro.
É preciso que algo muito forte aconteça para a gente resolver mudar de vida. E infelizmente a insegurança é o que mais nos assola.
Les Saints,
Infelizmente, é verdade. Quando passamos um tempo fora, percebemos o peso que carregamos todos os dias. E não é só o estresse do medo da violência, mas o estresse no trânsito, com os serviços públicos que não funcionam, com os altos preços de tudo… O Rio é lindo, mas as qualidades não são suficientes para superar os problemas. Simplesmente não se consegue viver em paz. Eu já tenho algumas doenças causadas pelo estresse que são características de pessoas bem mais velhas e que regrediram muito no tempo que passei fora. Espero que tudo se reverta quando essa tonelada de preocupações sair dos ombros… hehehe
Obrigada pela visita e volte sempre que quiser. 🙂
Prezados, boa tarde. Eu tenho lido todos os posts de vocês e adoro tudo. Obrigada 🙂
Meu esposo e eu estamos ainda na fase do IELTS (só eu vou fazer a prova) e já fiz o ECA dos meus cursos.
Já que vocês estão com viagem marcada (que Deus os acompanhe!!), tenho uma dúvida e gostaria que escrevessem um pouquinho sobre isso, podendo ser aqui mesmo como resposta à minha mensagem ou um texto maior, quem sabe! rs
Seguinte, queria saber a questão das malas de viagem. A companhia aérea permitiu que vocês levassem 3 malas cada um, por se tratar de imigração?
E depois que chegarem lá também quero saber como foi colocar a vida dentro de 4 (ou 6 malas) e como foi andar com tudo isso e mais as mochilas, bolsas de mão etc. pelos dois aeroportos.
Puxa, menti lá em cima, dizendo que era só uma pergunta…rs
Então, só mais uma: vocês alugaram casa/apartamento no Airbnb para os primeiros dias? Por quantos dias? Depois contem pra gente como foi tuuudo!
Um grande abraço aos dois, viu. A gente não se conhece mas eu torço muitíssimo pelo sucesso de vocês.
Oi Fabiana! Desculpe a demora, os comentarios do blog nao estavam sendo mostrados em ordem…
Foram tres caixas e uma mala, entao foram duas malas cada um.
Foi so um aeroporto… hehehe contratamos uma SUV pra levar a gente ate a casa onde ficamos. Colocar as caixas no carrinho do aeroporto ate que nao foi tao ruim.
Alugamos um quarto, na mesma casa que ficamos em 2014. No comecinho do blog tem posts sobre nosso intercambio.
Obrigada pela visita e pela torcida! 🙂
E seu processo, como esta?
Lindo seu texto! Acompanhei o processo de vocês e sempre torci muito. Nesse dia na linha amarela, eu estava ali deitada no chão junto com o meu marido e o meu filho de apenas 2 anos, eu tive uma crise de choro e até hoje estou tentando me recuperar… também fizemos o nosso processo para Edmonton no Canadá e estamos apenas esperando o PPR, faltam apenas 3 meses para completarmos 6 meses de espera. No exato momento em que eu me vi ali naquele tiroteio eu só pensava na minha imigração que poderia sair a qualquer momento, viver aqui está sendo muito difícil. Parabéns pela conquista, apesar da saudade que sentiremos de quem amamos estamos fazendo a coisa certa. Eu passei as minhas férias no Canadá e assim como você, tudo mudou dentro de mim. Beijo grande!
Olá Vanessa,
Seu comentário me emocionou. A gente escreve de coração aberto, nem imaginamos que, as vezes, ali pertinho de nós, estão pessoas compartilhando as mesmas dores e alegrias. Rezei muito pelas pessoas presas no asfalto aquele dia e certamente rezei pela sua família, então. Nessas horas a gente tem certeza que está seguindo o caminho certo. Desejo a vocês muita PAZ, saúde pra todas as mudanças que estão por vir, um PPR em tempo recorde (a gente que sabe o sofrimento que é essa espera) e uma adaptação rápida e sem dor. Ainda não sou mãe, mas acredito que depois que temos filhos o centro do nosso mundo muda de lugar e todo sacrifício vale a pena. Vocês estarão dando a ele uma oportunidade incrível, de crescer com uma liberdade de vida e de escolhas que infelizmente não conhecemos em nossa infância.
Que Deus os abençoe sempre. E nos vemos no Canadá! =)
Obrigada pela visita e volte sempre que quiser. 🙂
Paula, adorei o texto! Lindo e muito sincero. Eu e o marido estamos no início da espera do PPR. Tem menos de 1 mês do nosso AOR. Quero aproveitar para agradecer a você e o Rafael pelo blog! Me baseei muito no que vocês escreveram para dar andamento no meu processo por conta própria e realmente ajudou muito! As informações que vocês colocaram aqui são muito valiosas! Estão de parabéns.
Acabei fazendo um blog para nós, para também retribuir aos próximos aplicantes de EE o favor que vocês nos fizeram. E para conhecer mais pessoas na nossa situação tão singular. Só quem passa por ela entende as emoções que permeiam o caminho. Desejo para vocês o maior sucesso no canadá e muita mas muita paz e tranquilidade.
Olá Rey!
Obrigada pelo carinho, é sempre bom saber que estamos realmente contribuindo. A ideia do blog era justamente compartilhar, pois tanto foi compartilhado conosco, as informações da internet foram primordiais pro nosso processo.
Muito legal saber do blog de vcs, vou visitar. =)
Obrigada pela visita e volte sempre que quiser! 🙂
Estou na mesma situação que você. Aprovaram nosso visto esse mês e estamos indo para Vancouver em março. Queremos muito ir..nosso sonho. Mas estamos vendendo nossas coisas, nos despedindo de amigos e principalmente da família ta difícil. Mas como nosso objetivo é fugir da violência do Brasil e criar nossa filha num lugar mais tranquilo, acho que tudo isso vai valer a pena.
Oi Pathy!
De todas as fases, essa é a que mais mexe com a gente. A angústia da espera nos deixa malucos, mas a despedida da família e dos amigos amados é sem dúvida a parte mais difícil. A distância em si não é o problema, a incerteza de quando poderemos nos ver novamente é que nos mata por dentro. Mas tudo vale a pena, permaneçam firmes e pensem que, quem sabe, alguém mais se anima a seguir os passos de vcs? Sou “coach” de vários queridos agora… rsrsrsrs
Alguém te que abrir as portas, vai que a vida ainda te surpreende? Costumo focar nesses pensamentos positivos quando o medo da saudade, que certamente será enorme, aperta.
Obrigada pela visita e volte sempre que quiser! 🙂
Simplesmente quero dizer: parabéns!! Um site maravilhoso e super bem explicado. Eu e meu marido vamos dar entrada e estamos super animados para morarmos no Canadá.
Tenho uma dúvida, vc poderia me ajudar?
Eu e meu marido temos um apartamento que financiamos pela caixa, não queríamos vender, queríamos ir para o Canada e continuar pagando o financiamento. Vc sabe me dizer se é possível? Ou não pode ter financiamentos quando for comprovar a documentação para ganhar o visto de residente permanente?
Obrigada e parabéns pelo site, tirou mtassss dúvidas q eu tinha.
Bjs
Ola Kauana… desculpe a demora… o blog baguncou a data dos comentarios…
E possivel, mas a imigracai vai levar em consideracao que voce tem uma divida na hora de analisar suas financas… Tem que pesar tambem se vai ser possivel continuar com esta despesa.
Obrigada pela visita! 🙂